Iniciativa Negra
Foto: Bianca Cardoso

STF debate descriminalização da maconha enquanto Senado propõe PEC punitivista

Lorena Ifé
Artigo
14/03/24
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Março tem sido o mês de debate da pauta sobre drogas no Brasil. Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) julga a descriminalização do porte da maconha para uso pessoal, ao mesmo tempo, o Senado apresentou uma emenda que criminaliza o porte de qualquer quantidade de drogas ilícitas.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou no dia 13 de março, uma proposta de emenda à Constituição (PEC 45/2023) que criminaliza pessoas que forem pegas com qualquer quantidade de droga ilícita, mesmo que seja para uso pessoal, com fichamento e punições socioeducativas.

A chamada “PEC das Drogas” foi apresentada pelo presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e é uma reação ao julgamento que vem sendo feito no STF, sobre a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, que foi retomado no dia 6 de março. 

Para Nathalia Oliveira, socióloga e cofundadora da Iniciativa Negra, a aprovação no Senado traz um alerta sobre o quanto é preocupante a perspectiva dos senadores sobre a política de drogas. “Os senadores que aprovaram a PEC na CCJ entenderam que esse pedido não está em desconformidade com as leis vigentes e nem com a Constituição, enquanto juristas afirmam que é inconstitucional esse pedido uma vez que lesa o princípio da proporcionalidade da pena, porque o uso de drogas para si não fere terceiros”, comentou, ao afirmar que essa decisão tem uma perspectiva punitivista.

Após esta aprovação, a PEC também precisa passar por dois turnos de votação no plenário do Senado, seguir para a Câmara dos Deputados, onde também vai tramitar pela CCJ, comissão especial e outras duas votações no plenário antes de ir para sanção presidencial. 

STF e a descriminalização da maconha

O julgamento do STF discute se poderá ser descriminalizado o porte de maconha para uso pessoal, feito pelo Recurso Extraordinário (RE) 635659. Inicialmente o debate tratava apenas sobre a descriminalização do porte, mas atualmente há também a definição da quantidade permitida. Até o momento, 8 dos 11 ministros já votaram sobre o tema, com 5 votos a favor e 3 votos contra. A análise foi suspensa após um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Para Dudu Ribeiro, pesquisador especializado em segurança pública e cofundador da Iniciativa Negra, a descriminalização do porte não vai reduzir o encarceramento de pessoas hoje usuárias e transformadas em traficantes. “As pessoas não vão deixar de ser presas e a guerra de drogas não vai terminar. No entanto, a gente permite que o Estado brasileiro e a sociedade avancem na compreensão de que é necessário mudar a rota da política de drogas atual”, analisa o especialista. Ainda assim, ele aponta que o julgamento no STF amplia o debate na sociedade “acerca da necessidade da superação de uma forma única de lidar com o tema do uso de substâncias, que é a criminalização, que é o encarceramento, a prisão e o abuso”, diz.

Caso o STF decida pela descriminalização, os ministros ainda têm que definir quantos gramas seriam permitidos. Já o texto aprovado na CCJ pretende alterar uma cláusula da Constituição que é cláusula pétrea. O Supremo Tribunal Federal (STF) entende que as cláusulas pétreas podem ser alteradas ou restritas, desde que sua essência fundamental não seja modificada. Portanto, a proposta do Senado poderá enfrentar contestações judiciais devido a essa questão.

Em junho de 2023, a Iniciativa Negra lançou a pesquisa “Iniciativa Negra por Direitos, Reparação e Justiça” que propôs um olhar sobre os impactos da atual política de drogas em diferentes territórios. A análise se traduziu em premissas para mobilizar ações de reparação e mudança da lógica proibicionista da política de drogas. Entre as recomendações estão a regulamentação da Cannabis e a anistia de pessoas envolvidas no conflito da guerra às drogas. Demonstrando que a PEC das Drogas anda em contramão aos diagnósticos propostos.

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