Iniciativa Negra
Mesa de debate no lançamento do relatório 'Pele alvo: a cor que a polícia apaga'. Participantes estão em uma mesa, atrás está o banner da Rede de Observatórios, da esquerda à direita estão Gil Mendes, Nathália Oliveira, Caroline Pereira e Dudu Ribeiro. Foto: Renato Cafuzo.
Mesa de debate no lançamento do relatório 'Pele alvo: a cor que a polícia apaga'. Participantes da esquerda à direita estão Gil Mendes, Nathália Oliveira, Caroline Pereira e Dudu Ribeiro. Foto: Renato Cafuzo.

‘Pele alvo: a cor que polícia apaga’ levanta debate sobre letalidade policial em edição do Boteco Brasileiro de Política de Drogas

Artigo
18/12/22
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Rede de Observatórios da Segurança apresenta os dados do boletim ‘Pele alvo: a cor que a polícia apaga’ com debate e samba no Boteco Brasileiro de Política de Drogas em São Paulo

No dia 17 de novembro, o Boteco Brasileiro de Política de Drogas em São Paulo ganhou uma edição especial. A Rede de Observatórios da Segurança lançou o boletim ‘Pele alvo: a cor que a polícia apaga‘, a Rede é um projeto idealizado pelo Centro de Estudos em Segurança e Cidadania (CESeC) que conta com a participação de organizações em sete estados, atualmente a Iniciativa Negra coordena o Observatório de Segurança de Salvador.

A abertura do lançamento contou com a participação do poeta Akins Kintê, como mestre de cerimônia, Pedro Paulo dos Santos e Jonas Pacheco, integrantes do Observatório da Segurança do Rio de Janeiro. A mesa de debate foi mediada por Nathália Oliveira, cofundadora e coordenadora executiva da Iniciativa Negra, e contou com falas de Caroline Pereira, do Grupo mundo do trabalho e suas metamorfoses;  Gil Mendes, jornalista e repórter na Ponte Jornalismo; e Dudu Ribeiro, cofundador e coordenador da Iniciativa Negra e coordenador do Observatório da Segurança da Bahia.

O formato de boletim apresentado em ‘Pele alvo: a cor que a polícia apaga’ é realizado anualmente e está em sua terceira edição, os levantamentos buscam evidenciar como a letalidade policial impacta majoritariamente pessoas negras e é uma política em vigência. Os números desta edição revelam que ao menos cinco pessoas negras são mortas todos os dias pela polícia.

O evento de lançamento aconteceu em São Paulo no Boteco da Dona Tati. Para comentar os dados no lançamento, Pedro Paulo dos Santos destacou a importância de se entender o porquê de eles não trazerem novidades à primeira vista. “O que a gente tá querendo colocar com esses dados não é que simplesmente a polícia mata ou tem uma seletividade racial. Mas sim, que o fato de todo ano a gente mostrar a mesma coisa, significa que a polícia ser racista não é um desvio, não é o viés, é parte da própria função da polícia”, explica Pedro Paulo ao apresentar o boletim.

Os dados levantados mostram os índices de letalidade policial em sete estados: Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. Foram monitoradas 3.290 mortes em ações policiais realizadas no ano de 2021, desse total, 2.154 eram pessoas negras. Ainda que os números sejam alarmantes, Jonas Pacheco levantou as dificuldades para realizar o monitoramento e ter os dados dos estados, muitas vezes impossibilitando uma análise mais próxima da realidade.

“Uma grande dificuldade de produzir esses dados é a questão da transparência. Porque nem sempre esses dados são produzidos [pelo Estado] com um certo rigor e passados para a sociedade civil com qualidade. E, além da dificuldade de obter esses dados em alguns estados, muitas vezes, eles não vêm com a informação de raça/cor. Então, a gente tem a informação do número de mortos, mas sem o indicador racial”, relatou Jonas. 

Pele alvo: dos números que deveriam orientar políticas públicas para a mudança 

A importância de monitoramentos como os realizados pela Rede de Observatórios da Segurança foi um dos pontos trazidos pelos participantes durante as falas. Mas também ressaltaram a necessidade de utilizar esses números para a criação de políticas públicas que combatam o cenário de violência policial.

No período do lançamento do boletim, o governador da Bahia, Rui Costa, foi questionado pela imprensa a respeito dos dados. Segundo o boletim, no estado uma pessoa negra é morta pela polícia a cada 24h, colocando a Bahia como o estado mais letal do nordeste. Trazendo esse gancho para o debate, Nathália Oliveira provocou os participantes a trazer um contraponto para o posicionamento de Rui Costa de que os dados são dessa forma pelo fato de a maioria da população também ser negra.

Dudu Ribeiro levantou um caminho expandindo a responsabilidade para o poder público em geral sobre a utilização desses dados. “Um dos desafios que temos agora, é entender que não queremos apenas um confronto com o executivo ou com qualquer governador. Inclusive, o nosso trabalho é colaborar, colocar os dados à disposição da sociedade civil, que pensa sobre o tema, dos pesquisadores e pesquisadoras dentro e fora das universidades”. 

O coordenador da Iniciativa Negra também completou sua fala comentando os efeitos danosos da política de drogas em vigência e como o orçamento público é sequestrado em nome de uma guerra que se dá contra pessoas e não substâncias como é disseminado.

Caroline Pereira ressaltou a importância de se debater o racismo dentro das estruturas e instituições policiais. “Como que a gente vai fazer a responsabilização para além de quem tá ali apontando a arma, efetuando essa morte? Podemos pensar isso por dentro das polícias. Quem são as cabeças nas polícias, quem são as pessoas na Secretaria de Segurança Pública que precisam estar mais atentas e serem publicamente responsabilizadas pela recorrência desses eventos”, aponta Caroline.

Apontando para o campo da comunicação, Gil Mendes trouxe a importância de se fiscalizar e cobrar a manutenção da transparência de dados por parte do poder público. “Se você não responsabiliza um órgão que não quis mandar dados e aí, acontece o que? Então, tem que haver um mecanismo de controle das polícias, mas também uma fiscalização da sociedade civil que possa cobrar esses números de transparência de forma clara. Tem que haver uma responsabilização para quem se nega a repassar esses dados, que são dados públicos de interesse social”, explica Gil. 

Além do lançamento no Boteco da Dona Tati, entre os dias 16 e 18 de novembro, os pesquisadores da Rede de Observatórios da Segurança se reuniram com grupos de estudos em São Paulo para debater os dados do boletim ‘Pele alvo: a cor que a polícia apaga’.

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