Ato público acontece todos os anos no dia 1º de abril, em forma de bloco carnavalesco, denunciando as mentiras contadas pelo Estado. Além da presença no cortejo, a Iniciativa Negra também participou do ciclo de seminários que antecedeu o Cordão, em uma mesa de debates sobre a guerra às drogas e seus efeitos.
A Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas esteve presente nas atividades do 12º desfile e escracho do Cordão da Mentira, um ato público que acontece no centro de São Paulo sempre no dia 1º de abril – data do golpe que instaurou a ditadura civil-militar no Brasil em 1964. Em forma de bloco carnavalesco, o Cordão utiliza músicas e intervenções artísticas para denunciar violações de direitos humanos não apenas durante a ditadura, mas também na atualidade, tendo a participação de musicistas, grupos de teatro e coletivos culturais, além de movimentos sociais e da sociedade civil. Com o tema “Desfile Para Adiar o Fim do Mundo” (inspirado no livro de Ailton Krenak, Ideias para Adiar o Fim do Mundo), o ato desse ano chamou atenção para o genocídio indígena, palestino e da população preta e periférica.

Nos dias que antecederam o desfile, de 29 a 31 de março, o Cordão organizou um Ciclo de Seminários com atividades a respeito destes temas, incluindo mesas, oficinas, filmes, exposições e apresentações musicais. A diretora executiva da Iniciativa Negra, Nathalia Oliveira, participou da programação, na mesa “Guerra às drogas: Guerra a quem?”, que aconteceu no dia 29. Ao lado de Nathalia, estavam também Danylo Amílcar (Os 9 que perdemos), José Claudio Souza Alves (Sociólogo e Escritor), Juliana Siegmann (BDS América Latina e Frente Palestina), Maurício Monteiro (Frente dos Sobreviventes do Cárcere e Sobrevivente do Carandiru) e Daniel Mello (A Craco resiste), contando ainda com a mediação de Gabriel da Silva (Núcleo Leila Khaled). Em sua fala, Nathalia destacou os efeitos desiguais da guerra às drogas na realidade da população negra e periférica, e apontou para a necessidade de mudanças realmente estruturais em relação às políticas de drogas, segurança pública e direitos humanos. “Uma vitória não é só enterrar um projeto de lei, como a criminalização das drogas ou do aborto. Uma vitória é enterrar uma ideia que seja nociva ao desenvolvimento pleno da humanidade”, afirmou.

Na terça, 1º de abril, o Cordão saiu em desfile pelo centro de São Paulo, partindo do Pátio do Colégio, local construído por jesuítas portugueses, que é considerado marco de fundação da cidade de São Paulo. De acordo com Alex Barcellos, que é assessor de advocacy da Iniciativa Negra e estava presente no ato, até mesmo locais como o Pátio foram escolhidos por causa de algum simbolismo ou denúncia. Como ele conta, “no Pátio do Colégio, acontece a mentira da criação e da formação ideológica do que é essa cidade racista e preconceituosa. E todo o trajeto passava por lugares importantes e históricos: o Departamento de Penitenciária do Estado de São Paulo, a Secretaria de Cultura do município, a Prefeitura, a Secretaria de Direitos Humanos, de Serviço Social, o Prisômetro. E terminou na frente da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, ali também sendo um ponto de grito e de revolta contra as diversas violências do Estado. Foi simbólico e importante porque são territórios que também apagam uma memória da cidade de São Paulo”.

O ato teve a participação de artistas, ativistas e lideranças indígenas, sobreviventes do sistema prisional, partidos políticos, sociedade civil e movimentos sociais, tendo uma presença expressiva de mães e familiares de vítimas da violência do Estado, vindo de movimentos como Mães de Maio, Mães de Acari, Mães de Manguinhos, Mães de Barueri, Mães de Osasco, Mães da Leste, Os 9 que perdemos e Mães da Paraisópolis. Para Alex, as pautas relevantes e a presença de tantos movimentos fazem do Cordão da Mentira um espaço importante e potente, que a Iniciativa Negra reconhece e trabalha para fortalecer: “esse é mais um campo de luta em que a Iniciativa se coloca, não só acompanhando, mas também agindo na esfera do advocacy, colaborando nesse debate contra o genocídio e contra as mentiras que são contadas pelo Estado”, afirma.
(Reportagem por Murilo Araújo
Fotos por Luis Fernando Petty)